Diante de uma infração por excesso de velocidade, há grandes e reais chances de o infrator não ser o real condutor do veículo ou seu proprietário. Para esses casos, é possível indicar o responsável pelo ato ilícito. Decorrido o prazo para a indicação em processo administrativo, também é possível a indicação via processo judicial. Saiba mais.
De acordo com nossa legislação, uma infração de trânsito, data que foi cometida, até a notificação do proprietário do automóvel, não pode ter prazo superior a 30 (trinta) dias, sob pena de nulidade. Ocorre que as autoridades de trânsito estão se demonstrando cada vez mais eficazes nesse quesito, de forma que as notificações sempre chegam dentro do tempo definido por lei.
Contudo, se a notificação chegar ao proprietário em tempo superior, sua nulidade poderá ser questionada administrativamente. Da mesma forma, também é possível discutir se não houver fotos ou provas admissíveis na atribuição da multa, ou ainda, questionar se o procedimento adotado foi legítimo e adequado perante as formas legais, tais como o local de instalação das câmeras, visibilidade perante os motoristas, lei regulamentar da via, dentre outros fatores.
Não obstante, há que se observar que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), em seu art. 257, e incisos, atribui responsabilidades entre condutas do proprietário do veículo, embarcador e transportador, conforme segue:
Art. 257. As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.
§ 1º Aos proprietários e condutores de veículos serão impostas concomitantemente as penalidades de que trata este Código toda vez que houver responsabilidade solidária em infração dos preceitos que lhes couber observar, respondendo cada um de per si pela falta em comum que lhes for atribuída.
§ 2º Ao proprietário caberá sempre a responsabilidade pela infração referente à prévia regularização e preenchimento das formalidades e condições exigidas para o trânsito do veículo na via terrestre, conservação e inalterabilidade de suas características, componentes, agregados, habilitação legal e compatível de seus condutores, quando esta for exigida, e outras disposições que deva observar.
§ 3º Ao condutor caberá a responsabilidade pelas infrações decorrentes de atos praticados na direção do veículo.
§ 4º O embarcador é responsável pela infração relativa ao transporte de carga com excesso de peso nos eixos ou no peso bruto total, quando simultaneamente for o único remetente da carga e o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for inferior àquele aferido.
§ 5º O transportador é o responsável pela infração relativa ao transporte de carga com excesso de peso nos eixos ou quando a carga proveniente de mais de um embarcador ultrapassar o peso bruto total.
§ 6º O transportador e o embarcador são solidariamente responsáveis pela infração relativa ao excesso de peso bruto total, se o peso declarado na nota fiscal, fatura ou manifesto for superior ao limite legal.
§ 7º Não sendo imediata a identificação do infrator, o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, na forma em que dispuser o CONTRAN, ao fim do qual, não o fazendo, será considerado responsável pela infração.
§ 8º Após o prazo previsto no parágrafo anterior, não havendo identificação do infrator e sendo o veículo de propriedade de pessoa jurídica, será lavrada nova multa ao proprietário do veículo, mantida a originada pela infração, cujo valor é o da multa multiplicada pelo número de infrações iguais cometidas no período de doze meses.
§ 9º O fato de o infrator ser pessoa jurídica não o exime do disposto no § 3º do art. 258 e no art. 259.
Em se falando de infração por excesso de velocidade, prevista no art. 218, CTB, há grandes e reais chances de o infrator não se tratar do real condutor na hora do fato, tampouco o proprietário do automóvel.
Diz-se isso, pois uma terceira pessoa, que não seja o seu efetivo condutor, possivelmente poderia estar dirigindo o automóvel no momento da autuação.
Em sendo assim, o proprietário do veículo possui 15 (quinze) dias para defender-se e apresentar o real responsável pela infração imposta.
Em alguns casos, contudo, por caso fortuito ou não conhecimento da lei, o proprietário não indica o real condutor infrator e, com isso, alguém é punido por algo que não fez ou, quando do conhecimento da infração, já não há mais prazo para a indicação do responsável pela mesma.
Passado o prazo, o proprietário que viu lesado os seus direitos pode pleitear ingressar defesa administrativa junto ao órgão responsável. Contudo, somente as questões relacionadas à infração poderão ser discutidas, pois, após o decurso de prazo, não será realizar a indicação do condutor, seja via defesa prévia, no JARI, ou ao CONTRAN. Há um entendimento de que, decorrido o prazo, cessa o direito à indicação.
SITUAÇÃO HIPOTÉTICA
Imaginemos, então, o proprietário de um automóvel punido corretamente pela lei e se encontrando com a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) suspensa, em fase de reciclagem. Se, por exemplo, esse proprietário perder o prazo para a indicação do condutor, acredite, ele poderá ficar até 02 anos com a CNH caçada injustamente.
Para casos análogos, ou seja, semelhantes, há o poder judiciário, com a missão de, em tais situações, socorrer inclusive àqueles que dormem. Explica-se: em nossa Constituição Federal está insculpido o princípio da inafastabilidade de jurisdição, segundo o qual, a lei não excluirá da apreciação do judiciário lesão ou ameaça de direito.
Em sendo assim, é plenamente possível ao prejudicado ingressar com uma ação para a troca do agente infrator, ou seja, o efetivo causador da infração, desde que o mesmo assuma a culpa e o erro pela infração e pagando, inclusive, o valor atinente à multa.
Ocorre que, de acordo com a Constituição Federal, norma que está hierarquicamente acima das demais leis, aquele que não cometeu o erro, não pode suportar os prejuízos relacionados ao fato.
Bloquear o direito cristalino de alguém é ir contra o que todo cidadão busca no Poder Judiciário: justiça. É que há independência entre as instâncias administrativa e judiciária e, por analogia lógica, o prazo para a indicação do infrator somente se adequa aos atos administrativos, pois o judiciário é livre para apreciação e decisão do mérito.
Nesse sentido, há posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afirmando que, mesmo fora do prazo para a indicação do infrator, o proprietário tem direito de demonstrar em sede judicial que não conduzia o veículo no momento da infração de trânsito, sob pena de configurar ofensa ao princípio da inafastabilidade da jurisdição, previsto no art. 5º, inciso XXXV, da CF. Vejamos:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ILEGITIMIDADE ATIVA DA AUTORIDADE COATORA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. APRECIAÇÃO POR ESTA CORTE SUPERIOR. POSSIBILIDADE CONDICIONADA À ABERTURA DA INSTÂNCIA ESPECIAL POR OUTROS ARGUMENTOS. NECESSIDADE DE DISCUSSÃO QUE REQUER ANÁLISE DE LEI LOCAL. APLICAÇÃO DA SÚMULA N. 280 DO STF, POR ANALOGIA. NÃO-INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL VIOLADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 284 DO STF, TAMBÉM POR ANALOGIA. TRÂNSITO. RESPONSABILIDADE POR INFRAÇÃO IMPUTADA AO PROPRIETÁRIO EM RAZÃO DO QUE DISPÕE O ART. 257, § 7º, DO CTB. PRECLUSÃO TEMPORAL ADMINISTRATIVA. NECESSIDADE DE ANDAMENTO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. COMPROVAÇÃO, EM SEDE JUDICIAL, DE QUE O INFRATOR NÃO ERA O PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO. RESPONSABILIDADE DO CONDUTOR. INAFASTABILIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL. 1. Trata-se de recurso especial interposto pela Empresa Pública de Transporte e Circulação S/A - EPTC contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que, em apelação, desconsiderou a aplicação do art. 257, § 7º, do CTB por haver nos autos prova inequívoca de que o proprietário não era o condutor que cometeu a infração. O infrator de fato, após reconhecer sua responsabilidade, pede que lhe sejam atribuídas as conseqüências da violação às normas de trânsito. 2. Alega a recorrente ter havido ofensa aos arts. 22, inc. I, do Código de Trânsito Brasileiro - CTB e 267, inc. VI, do Código de Processo Civil - CPC - ilegitimidade passiva - e 257, § 7º, do CTB - apresentação do condutor infrator depois do prazo previsto e responsabilidade do proprietário. 3. Em primeiro lugar, no que tange à alegação de ilegitimidade passiva, é de se ressaltar que, em momento algum nestes autos, tal questão foi levantada, motivo pelo qual não houve debate sobre o ponto nas instâncias ordinárias. Seria caso, portanto, de reconhecer a ausência de prequestionamento. Entretanto, por se tratar de matéria de ordem pública e, além disso, considerando que a instância especial será aberta para avaliação de suposta ofensa ao art. 257, § 7º, do CTB, creio ser dever dessa Corte Superior manifestar-se sobre a controvérsia, ainda que, como será visto, para dela não conhecer. 4. Sustentando sua ilegitimidade, a parte recorrente diz haver violação ao art. 267, inc. VI, do CPC, devendo sua análise ser cumulada com o art. 22, inc. I, do CTB. Argumenta que "o DETRAN-RS [é] quem notifica o proprietário do veículo, informando, na parte superior da notificação, o prazo, local, meios e os dados necessários para que o proprietário, casa não seja ele o infrator, informe quem estava conduzindo seu veículo no momento da infração" (fl. 316). 5. Ocorre que, da leitura dos dispositivos já citados, não se extrai a tese da recorrente. O artigo do CPC já é conhecido e dispensa transcrição. O art. 22, inc. I, do CTB está assim redigido: "Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição: I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das respectivas atribuições;". 6. Como se observa, em momento algum estão discriminadas nas referidas regras quais as atribuições do Detran/RS e quais as atribuições da EPTC (recorrente). 7. As competências legais da recorrente estão previstas na Lei municipal n. 8.133/98 - diploma normativo que a criou. Seria necessário, portanto, uma incursão em lei local, com comparação à lei federal, para fixar quem seria a autoridade coatora. Entretanto, esta análise é vedada ao Superior Tribunal de Justiça por aplicação da Súmula n. 280 do Supremo Tribunal Federal, por analogia. A parte recorrente deveria ter promovido esta discussão, em bom tempo, na instância ordinária, porque a Corte Superior não pode discutir ofensa a direito local. 8. Mesmo o conhecimento de ofício das matérias de ordem pública, embora dispense o prequestionamento quando a instância especial for aberta por outro motivo, depende do cumprimento de alguns requisitos, entre eles a indicação precisa de dispositivo de legislação federal infraconstitucional que permita a compreensão exata da controvérsia, o que não ocorre no caso concreto. Há incidência da Súmula n. 284 do Supremo Tribunal Federal, também por analogia. 9. Em segundo lugar, em relação à malversação do art. 257, § 7º, do CTB - que determina que "[n]ão sendo imediata a identificação do infrator, o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, na forma em que dispuser o CONTRAN, ao fim do qual, não o fazendo, será considerado responsável pela infração" -, é preciso destacar que a preclusão temporal que tal dispositivo consagra é meramente administrativa. 10. Trata-se de medida instituída unicamente para frear a busca incessante pela verdade material no âmbito administrativo e compatibilizá-la com a necessidade de andamento dos procedimentos desenvolvidos pela Administração Pública - no caso, no que tange à aplicação de sanções de trânsito. 11. Obviamente, o proprietário, em sede judicial, tem direito de demonstrar que não guiava o veículo por ocasião do cometimento da infração, mesmo que tenha perdido o prazo administrativo para tanto. Entendimento diverso resultaria em desconsideração ao que dispõe o art. 5º, inc. XXXV, da Constituição da República vigente. 12. No caso dos presentes autos, o acórdão combatido consignou que "a declaração de fl. 45 comprova a ausência de responsabilidade do apelante [ora recorrido], uma vez que, por meio dela, Jorge Antônio Silva de Souza reconhece expressamente, de forma inequívoca, ser o condutor que cometeu a infração, e requer a transferência de pontuação à sua CNH" (fl. 306). 13. Assim sendo, a verdade dos fatos a que chegou o Judiciário é suficiente para afastar a presunção jurídica de autoria (e, conseqüentemente, de responsabilidade) criada na esfera administrativa. 14. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido.
(STJ - REsp: 765970 RS 2005/0113728-8, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 17/09/2009, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 02/10/2009)
Sendo assim, há que se entender que a preclusão temporal (decurso de tempo) do art. 257, § 7º, do CTB é meramente administrativa, tratando-se de medida instituída unicamente para obstar a busca incessante pela verdade material no âmbito administrativo e compatibilizá-la com a necessidade de andamento dos procedimentos desenvolvidos pela Administração Pública.
Em decisão semelhante, os julgadores reconheceram a existência de prova inequívoca de que o proprietário não era o condutor do automóvel, sobretudo diante da declaração assinada pelo infrator, em que reconhece sua responsabilidade. Desse modo, foi afastada a presunção de autoria criada na esfera administrativa e o órgão colegiado do tribunal confirmou a ordem de transferência da pontuação para a CNH do verdadeiro infrator. (20080110926839APC, Rel. Des. FLAVIO ROSTIROLA. Data do Julgamento 01/02/2012).
Logo, há que se entender que o prazo imposto na via administrativa não pode se sobrepor aos ditames e princípios constitucionais, uma vez que o julgador não fica cingido a números e, sim, ao direito, ou em outras linhas, para casos semelhantes, é possível à qualquer cidadão utilizar-se do Poder Judiciário, mediante o devido processo legal, para fazer valer o seu direito e indicar o real infrator, reavendo o seu direito de dirigir.
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